segunda-feira, 12 de abril de 2010

O impacto da iniciação científica

GELSON GENARO E MARIA DE FÁTIMA MARTINS

Construção do conhecimento. Esse é o foco central do complexo ensino-aprendizagem, mas como desenvolver tal procedimento é uma questão que vem merecendo inúmeras proposições. A visão mais conservadora do professor como uma espécie de “divulgador de conhecimentos” não é uma proposta viável, já que impede o aluno, por si só, de elaborar um raciocínio crítico e autônomo, procedimento este que seria intensamente desejável na Universidade.
E, aliado a esse professor burocrático, temos o “produto final” desse processo: o aluno passivo, que apenas memoriza o assunto referente à aula, minimizando o sucesso do ensino-aprendizagem. Pode-se, no máximo, esperar uma repetição, por parte do aluno, das respostas que o professor apresentou, esvaziando, dessa forma, as atividades primordiais do ensino: o questionamento e o raciocínio. Impedindo, dessa maneira, que ocorra a construção do conhecimento.
Portanto, essa visão deve ser modificada, e o professor deve ser alguém capaz de proporcionar ao aluno o desenvolvimento de sua curiosidade e de despertar o pesquisador que está dentro dele.
A partir do momento em que se abandona essa visão mais conservadora, ambos, professor e aluno, passam a ser sujeitos ativos na construção desse conhecimento, não como algo que é passado a outrem, sem questionamento, sem reflexão. É exatamente aqui que o conceito de “sala de aula” sofre crítica transformação. Essa “sala” passa a ser qualquer local onde se buscam soluções para problemas quaisquer. Esse processo pode ser um treinamento muito importante para o estudante. Mas como podemos fazer uso dessa proposta de estudo?
É exatamente aqui que a iniciação científica (IC) pode se tornar o catalisador do processo, tanto na formação do estudante como na produção de ciência. A graduação é a fase indicada para o processo de formação desses estudantes, que deverão ser os futuros pesquisadores, responsáveis pelas futuras gerações de outros pesquisadores, e assim sucessivamente.
A iniciação científica é um poderoso mecanismo que proporciona a integração do ensino com a pesquisa científica, inserindo o estudante, ainda na graduação, na atividade científica, formando, desse modo, sua mentalidade crítica. A partir desse ponto de vista, devemos fazer uso da iniciação científica como uma ferramenta continuamente presente na formação dos alunos, sendo uma condição necessária para as instituições de ensino superior proporcionarem esse treinamento por meio de seus docentes.
A participação desse aluno em projetos de pesquisa, culminando com um trabalho que pode ser subsequentemente desenvolvido na pós-graduação, é o ápice desse organograma.
Mas nem todos os estudantes irão seguir a carreira acadêmica, portanto nem todos devem fazer uso da iniciação científica? Errado. Todos devem, sim, utilizar a iniciação científica em sua formação, pois não é só na vida acadêmica que se pode fazer uso dos benefícios desse treinamento. O profissional, seja de qual área for, será um sujeito muito mais completo se tiver, em sua formação, um período em que participou de um processo de iniciação científica.
A principal vantagem de um estudante que participa de iniciação científica será sua maior capacidade de solução de problemas e sua capacidade de não estar limitado apenas às principais ferramentas de sua área de atuação. E, se esse estudante estiver focado na vida acadêmica, terá seu tempo de pós-graduação diminuído com esse treinamento, sendo melhor preparado do que aqueles que se dirigiram diretamente à pós, sem cursar a iniciação científica.
O orientador deve dedicar especial atenção ao andamento dos trabalhos de seu aluno de iniciação científica, tanto nos fundamentos teóricos como também nos práticos. O estudante deve, por sua vez, dedicar a maior parte de seu tempo extraaulas a essa atividade, devendo realizar um período previamente determinado de estágio na área, para avaliar as reais possibilidades de se identificar tanto com as técnicas e objetivos como também com o orientador.
A quantidade de tempo dedicada pelo docente a cada estudante é relativa, já que dependerá do tipo de estudo realizado, dos métodos que irão desenvolver e, por fim, da capacidade e dedicação de cada estudante.
Em relação ao estudante, a principal exigência é o tempo de dedicação. Tempo este que será voltado para as mais diversas facetas dessa atividade, sendo que deve entender que a iniciação científica é um esforço no aprimoramento de sua graduação. Os pontos relevantes que o aluno deve considerar, e dominar, são:
1) O método a ser utilizado na pesquisa. Se for um aluno iniciante, portanto, que não domine tal técnica, deve conceber um período de estágio para seu treinamento, antes do início do período oficial de investigação.
2) Aspectos básicos como inglês, estatística, informática, redação de documentos (como o próprio projeto, painéis, resumos etc.). Conhecer a literatura básica e também fazer levantamentos bibliográficos, atualizando-se no assunto.
Os diversos programas de iniciação científica existentes no Brasil focam o desenvolvimento dos alunos, proporcionando uma opção importante para o aprendizado, treinamento e aplicação das respectivas técnicas da área do conhecimento. O método científico deve ser inserido nessas condições, e deve-se ressaltar aos alunos a sua magnitude, bem como o orientador deve proporcionar condições para o aluno confrontar-se com os principais problemas da área do conhecimento, acompanhando-o de perto.
O foco principal da iniciação científica é colocar o aluno para praticar seus questionamentos dentro da perspectiva do método científico, privilegiando seu senso crítico, bem como sua criatividade. Também pode-se vislumbrar a possibilidade de o orientador, dentro desse processo que foca o aluno, conseguir condições primordiais para formar uma equipe, com uma redução significativa de tempo de treinamento na formação dos alunos envolvidos.
Por fim, o orientador deve estimular a participação dos estudantes em eventos científicos, bem como treiná-los na redação científica, árdua tarefa, que irá exigir muita dedicação de todos os envolvidos. Culminando num resultado muito mais ambicioso: a otimização da posição brasileira na produção de artigos científicos, proporcionado ao nosso país galgar posições importantes no ranking da produtividade científica mundial, graças a esse processo que teve início com o estudante batendo à nossa porta para solicitar o estágio inicial.

Gelson Genaro é orientador pontual (OP) do Programa de Pós-Graduação em Psicobiologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP
Maria de Fátima Martins é professora da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP
Jornal da USP 01/mar/10

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